Teatro Por Que Não? 13 anos fazendo arte

Bernardo Abbad

Teatro Por Que Não? 13 anos fazendo arte
Será possível fazer e viver de teatro em Santa Maria? Por que não? Foram essas perguntas que um grupo de artistas se fizeram há 13 anos e, desde então, provam que não só é possível, como transforma a vida de uma comunidade inteira. O grupo Teatro Por Que Não? é formado por sete integrantes que se conheceram durante as aulas no curso de Artes Cênicas da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e, ao se graduarem, passaram a promover espetáculos, cursos e uma diversidade de ações culturais. Eles acumulam no currículo, para além da Cidade Cultura, passagens por São Paulo, Paraná, Goiás, Santa Catarina, várias cidades do Rio Grande do Sul, e até mesmo Portugal.

Conforme Aline Ribeiro, 37 anos, atriz e a maquiadora “oficial” do grupo, o Por Que Não? é uma força coletiva resultante dessa união dos integrantes na UFSM. Ela conta que, no final do ano de 2009, eles faziam parte de várias montagens, como O Abajur Lilás e O Fim de Partida. Segundo ela, as pessoas envolvidas nos dois espetáculos decidiram, então, formar o grupo.

– Nós realizamos apresentações, aproveitando bastante o espaço da UFSM para ensaios e nossas montagens. Mas sabíamos da importância do teatro sair do campus e conhecer outros lugares. Então, no próprio ano de 2010, já participamos de festivais que agregaram ao nosso trabalho.

Logo no início dessa história de mais de uma década, a trupe já colocou o pé na estrada, com uma surpresa: o grupo teve um espetáculo aprovado em um festival de Blumenau (SC). Geralmente, as peças eram coordenadas por professores, mas a do Por Que Não? foi dirigida pelo integrante Felipe Martinez, que estava no 4ª semestre do curso na época.

Seguiram-se campanhas para viabilizar a participação do grupo em diversos festivais no Brasil e até no mundo. Logo surgiram convites para o grupo atravessar o Atlântico e se apresentar em Portugal.

Apoio

Fotos: Nathália Schneider (Diário)

Desde 2012 o grupo administra e centra as atividades no Espaço Cultural Victorio Faccin, juntamente com o Teatro Universitário Independente (TUI), que há mais de 50 anos agita a cena teatral da cidade.

Felipe Martinez, 34 anos, agora responsável pela direção de vários dos espetáculos do Teatro Por Que Não? aponta que um dos principais acontecimentos e fator determinante para que o grupo seguisse e se estruturasse enquanto coletivo de arte foi a entrada no Espaço Cultural:

– Foi um reconhecimento que o TUI deu ao nosso trabalho já naquela época e acabou movimentando nossa perspectiva de futuro de uma forma muito positiva. Quando saímos da universidade, nós fica sem certeza para onde ir. A partir desse momento, começamos a organizar nossos trabalhos artísticos de forma a pensar as montagens de maneira que possam circular e criar agenda. Isso acabou aumentando as participações em festivais.

Felipe conta que, no início da trajetória, o grupo alugava bastante o espaço do TUI para apresentar os espetáculos e, ao longo do tempo, criaram um público fiel que frequentava o local:

– Na época, o TUI estava com uma necessidade de ter mais pessoas para trabalhar, então perceberam que o Por Que Não? fazia acontecer o que eles precisavam. Então, expuseram que o teatro estava com dificuldades para se manter e pagar as contas e perguntaram se nós não embarcaríamos nessa aventura. Prontamente aceitamos e, desde então administramos o espaço e trabalhos de forma conjunta – finaliza.

Cursos

Em fevereiro, iniciaram as matrículas para novas turmas presenciais do curso de teatro do grupo. Juliet Castaldello, 32 anos, integrante do Por Que Não? desde a formação, conta que o curso está completando 10 anos e mais de mil alunos já passaram pelas aulas. São turmas para adolescentes e adultos, em que as pessoas aprendem sobre consciência e expressão corporal e vocal, jogo teatral e improvisação, montagem de cenas e apresentação ao público. As aulas começam em março.

– São pessoas de várias áreas e que não querem, em muitos casos, tornarem-se atores profissionais, mas, sim, conhecer esse universo do teatro, participar de uma atividade diferente e socializar. Nós temos alunos que ficam por vários anos e agradecem muito, dizendo que o teatro mudou suas vidas. Para nós, é uma satisfação imensa dar aulas, porque é uma forma de nunca esquecer do básico e estar sempre atualizado sobre teatro – finaliza Juliet.

Os espetáculos

Ao longo dos 13 anos, o Teatro Por Que Não? já realizou inúmeros espetáculos. Muitos deles fizeram parte da programação do Entrevero, festival internacional de teatro realizado pelo grupo em 2018 em Santa Maria e que, devido ao grande sucesso, teve uma segunda edição em 2022. A terceira deve ocorrer em 2024! A foto acima destaca o palco do Espaço Cultural Victorio Faccin, onde os artistas posaram para a capa da MIX. Ela está repleta de elementos que fazem parte não só dos cenários dos espetáculos, como também ajudam a contar a história do grupo.

AMORES AOS MONTES

Em um ritmo acelerado como um coração apaixonado, o espetáculo é uma montagem de cenas curtas que mostra que o amor (ou sua ausência), pode estar em qualquer lugar.

SERENA PROCURA UM PLANETA

A peça traz as aventuras de Serena que ,cansada de viver no Planeta Bacalate, viaja pelo universo em busca de novos lugares.

O CIRCO DO MUNDINHO FELIZ

Mundinho era o palhaço mais dedicado que surgiu no Circo Mofado. Mas para alcançar sucesso é preciso muito trabalho.

MEDEIA

O espetáculo Medeia é o choque entre a revisitação ao mito grego, e o olhar contemporâneo sobre as imposições patriarcais infligidas às mulheres.

NÃO HÁ MAR

Dois personagens buscam dentro de si as respostas para perguntas sobre problemas que parecem distantes em tempos de pandemia e isolamento.

PODE SER QUE SEJA SÓ O LEITEIRO LÁ FORA

Em meados dos anos 70, jovens ocupam uma casa abandonada para passar a noite e escapar da chuva, em uma intensa estadia.

A trupe

Anderson Martins – ator e figurinista

“Eu e o Geison Sommer entramos no grupo em 2015, momento que estava estreando o espetáculo Say Hello Para o Futuro e isso me marcou muito. Embora nos conhecêssemos da universidade, estar no espaço com todos, trabalhando juntos, foi muito bom. Fiz figurino, trilha sonora. Me marcou muito também, enquanto artista, ter podido apresentar o espetáculo Pode ser que seja só o leiteiro lá fora no Theatro São Pedro, em Porto Alegre. Era algo que até brincávamos sobre a possibilidade. Eu não imaginava que isso pudesse acontecer tão cedo na minha vida, pisar em um palco que é tão respeitado e um lugar histórico do Rio Grande do Sul. Então foi um momento bem especial que o grupo me proporcionou”.

André Galarça – ator e gerente financeiro

“Acima de tudo é uma escolha e uma trajetória de vida, de formação pessoal e profissional. Esses anos todos me ajudaram na formação social e artística também, em muitos âmbitos. Conviver há 13 com as mesmas pessoas, unidas por um propósito comum, foi muito transformador. Nunca imaginei que pudesse ter esse tipo de trabalho com teatro. No inicio da faculdade, eu achava que não era uma possibilidade e o grupo me mostrou o contrário, que era possível fazer teatro coletivo em Santa Maria. Acredito que fiz a escolha certa. Sempre que um projeto é aprovado, um espetáculo novo estreia, ser recebido pelo público em uma cidade diferente, é uma felicidade. Talvez o momento mais importante dessa história, para mim, tenha sido justamente o momento onde decidi que queria estar no grupo, quando nos reunimos e decidimos: “vamos trabalhar juntos”. E por mais que eu tivesse outros objetivos na época eu escolhi o Teatro Por Que Não?, e isso me marcou muito”.

Aline Ribeiro – atriz e maquiadora

“A vivência no Teatro Por Que Não? me impactou muito. Foi por causa do grupo que eu decidi morar em Santa Maria. Eu queria só fazer a faculdade de Artes Cênicas e voltar a São Paulo, que é minha cidade, mas ver que aqui em Santa Maria estava tendo oportunidade de trabalhar com isso, decidi ficar e fazer minha vida. Aqui casei e tive a criança mais linda do mundo. Destaco o momento quando começamos a fazer nossos próprios textos, como o espetáculo Amores aos Montes. Já estávamos trabalhando com textos autorais na universidade e é algo que leva nossa cara, a gente sempre busca, através do teatro, passar uma outra mensagem. A gente está aí para demonstrar uma situação e levar um questionamento para quem assiste. Dessa nossa história, eu destaco esse gosto que a gente tem em montar textos autorais”.

Felipe Martinez – diretor de teatro

“Acredito que todos nós mudamos, mas eu percebo que, ao longo desses 13 anos, eu consegui encontrar alguns caminhos para fazer com que o meu trabalho consiga ter uma proposta, que é algo muito difícil de desenvolver, esse trabalho pessoal. E isso dentro de um grupo que tem muito essa característica de coletividade. Então foi muito impactante perceber que pude desenvolver trabalhos pessoais, percebendo qual tipo de teatro, qual linguagem, para qual público poderia levar meu trabalho. É um desenvolvimento pessoal e artístico que tive nesse período, que vem desse coletivo e ao mesmo tempo oferece para esse coletivo, também, uma troca, assim como acredito que acontece com todos nós”.

Geison Sommer – ator e produtor

“O Por Que Não? me mostrou a possibilidade de viver de teatro de uma forma concreta, repensar o trabalho de arte, dialogar com a comunidade, pensar na elaboração de projetos, tudo isso alicerçado em uma dinâmica com meus colegas. É incrível, falamos que além de colegas de trabalho, somos muito amigos e nos apoiamos de diversas formas. Pude entender que o trabalho pode ser esse suporte para a vida. Então o Por Que Não? ajudou a organizar a minha vida e perceber que o trabalho com arte é possível, viável e pode ser feito em coletivo. Destaco o Amores aos Montes, que foi o primeiro processo que eu participei como ator no grupo, já que entrei em 2015, e foi muito legal. Destaco também Pode ser que seja só o leiteiro lá fora, que coroa os nossos 10 anos. Foi desenvolvido com dificuldades na pandemia e deu esse resultado que gera um retorno muito legal do público”.

Juliet Castaldello – atriz

“É o maior projeto da minha vida, o que mais me dedico. Participar de algo assim era uma intenção que eu já tinha desde adolescente, queria muito fazer teatro de grupo quando entrei na faculdade. Mas não sabia se era possível. E aqui é o lugar onde consigo alcançar esse objetivo e me representa muito enquanto artista. Também me deixa muito feliz porque são trabalhos que falam sobre cosias que eu considero relevantes não só para mim, como para a sociedade e o mundo em que a gente vive. Ao longo dessa história, eu destacaria toda a nossa relação de formação de público, tanto com os espetáculos quanto com os cursos. Conseguimos gerar uma movimentação muito grande. Destaco também o Amores aos Montes, que atinge muitos públicos por ser um espetáculo de rua e ter todo o grupo envolvido e marcou uma nova época no Teatro Por Que Não? Destaco também os 10 anos que, mesmo no meio de uma pandemia, nós conseguimos manter nossos trabalhos e o espaço ativo”.

Luiza de Rossi – atriz e iluminadora

“Eu acredito que, se não fosse a força do grupo, eu não estaria fazendo teatro e vivendo disso. Criar oportunidades de trabalho na cultura assim, no interior do Estado, é bem complicado, então a gente se fortalece nessa convivência. Desde o momento da criação, na faculdade, seguimos em formação constante, isso não pode parar. Eu destaco muito o momento da maternidade aqui no Teatro Por Que Não?. Quando eu e a Aline ficamos grávidas, houve um acolhimento muito grande pelo grupo, do tipo que não se encontra em qualquer lugar. Ser mãe é uma experiência única e singular, mas ela vem com o medo de perder o trabalho ou ser passada para trás por alguém que não é mãe, por exemplo. Então é incrível esse acolhimento que ocorre em qualquer situação. É tudo muito humanizado, mesmo que tenhamos que vencer desafios, como trabalhar de manhã, tarde e noite, mas isso é muito importante. Só tenho a agradecer a essa convivência, ao amor e ao trabalho”.

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